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por que continuarse ao final
certamente
não haverá
recompensa?
não haverá paz
nem pão
nem palavra
todos os dias buscando motivo
para prosseguir
buscando prosseguir para
poder
continuar
todos os dias o credo rançoso
a brisa antiga
infeliz
lembrança de potes vazios
seus sonhos
a infância
escondida nos gritos contidos
do dia
nunca acenderão a luz
para podermos ver
o que seríamos
caso não fôssemos
exatamente isso
meta, busca, sequência
ou talvez espera
do que nunca teve nome
e todo mundo parece sentir
que conhece
ao final de uma, outra
era
afugentando o passado
que retorna com insistência
engolindo estes dias
que caminham cegos para o futuro:
oco sentido escuro
horizonte para além do palpável
sempre o amanhã no gosto
da espera, no rosto
da quimera
ao final de uma, outra surra
conta atrasada, acordar cedo
o fim de semana enfim o fim da linha
as férias enfim o fim
a aposentadoria o fim
a morte o fim do expediente
a liberdade para o caos sem palavras
depois e ainda e enquanto e sempre
todos os dias se emendando para um apagar o outro
todos os inícios se juntando para que não haja início
todas as variações se sucedendo em vertigem de modo que não haja
vertigem
a linguagem está morta
sepultem-nos, árvores
ignorem-nos, rios
esqueçam-nos, nuvens
o dia começa a entrar pela janela e novamente não dormi
# São Paulo, 17 de maio de 2021.